terça-feira, 25 de novembro de 2014

Axé, Ori

Axé: Força
        Poder
        Fundamento
        Vitalidade
        Segurança

"Eniyan  Ko  Fe Fi  Eru fi aso, Ori eni ni so ni"

As pessoas não querem que você sobreviva,
mas o seu Ori trabalha para você.

Força interior, apesar das dificuldades.

Ori = desejo, sabedoria (Ego)
Orixá = caminho, energia pura

24 anos e nenhum aviso de chegada em terra firme.
Cinco astros em Capricórnio mas,
aonde o diagnóstico,
a chaga, o peso?

domingo, 16 de novembro de 2014

Partículas de Amor

Ao te conhecer, desacreditei
Como pode uma mulher assim?
Toda solar, me derreteu

Virei água do mar, evaporei
Agora eu sou partículas de amor
Vento que sopra na crista

Bolha de espuma replica
Onde você estiver, eu estarei
Maresia no ar há te acompanhar

L. Santana

terça-feira, 11 de novembro de 2014

um útero é do tamanho de um punho



















porque uma mulher boa
é uma mulher limpa
e se ela é uma mulher limpa
ela é uma mulher boa


há milhões, milhões de anos
pôs-se sobre duas patas
a mulher era braba e suja
braba e suja e ladrava


porque uma mulher braba
não é uma mulher boa
e uma mulher boa
é uma mulher limpa

há milhões, milhões de anos
pôs-se sobre duas patas
não ladra mais, é mansa
é mansa e boa e limpa


Angélica Freitas

quarta-feira, 29 de outubro de 2014

"[...]
a este deus
que levanta a poeira dos caminhos
os levando a voar
consagro este suspiro
nele cresça até virar vendaval."

Paulo Leminski
Na minha boca ainda
o gosto da tua boca
e o verso do cazuza
"Ela é um satélite
que só quer me amar"
Te digo,
O mais saboroso tipo de revolução
está nas minhas-tuas curvas:
Guardam o próximo mistério
E eu quero tudo,
tudinho,
no próximo Hotel.

quinta-feira, 23 de outubro de 2014

Espírito do meu temporal


Eu sou a cruz
Eu sou o sangue
Eu sou o demônio
Eu sou a anemia
Eu não renasci,
Apenas forcei coragem.
Eu sou o sol
Eu sou a falta de energia,
Eu sou a insistência.
Eu venço porque sou.
 
 J. Lira Corrêa

terça-feira, 21 de outubro de 2014


Pudera existir uma única vez de verdade
com minhas intenções no meu corpo
onde o flerte com a carne
,matéria que me reveste,
casa com o além-túmulo

mas de morte em morte eu vou pairando
para onde o passo
um pé metafísico
caminha sobre a peri-estrada:
desenha voltas e mais voltas no ar.

domingo, 19 de outubro de 2014

Pisar em ovos?
jamais!!
Meus pés pisam firmes
entre crateras e planícies.

quarta-feira, 15 de outubro de 2014

É Maria?!
É, num é.
É de festa, e é de ginga
e de choro, sim sinhô
Coração acobertado
de bem e bem querer
e indo e indo
vou seguindo
Ê Maria!
Bem-me-quer!
"E queixas
 só dá rugas.
E vento seca,
amor enxuga."

Novos Baianos
Encrenquei. Malei-me meu pai, malei-me
que paz há de estar.
Carícias de palavras,
benfazeja mais que o mal maior.
Há a luz, há a treva,
Tudo Há, há espaço para tudo
no haver.
Benfazeja seja meu nome
que outro nome não há.

Qual febre é a febre que me queima esta noite?
cada dia o mais longo passo de uma eternidade
no sonho eu digo:
-Quem ousa usar um dos meus múltiplos nomes?
falava também de anjos mas sem saber seu significado

Vertical como um sol eu me erguerei
guardarei no íntimo a minha lua
eu sei a febre que me queima
só não sei de onde veio nem porquê
e temo, por isso também guardo a minha lua
no peito, no pátio mais escuro
onde não posso ver.


10.09.2014

terça-feira, 14 de outubro de 2014



"Um deus também é o vento
só se vê nos seus efeitos
árvores em pânico
bandeiras
água trêmula
navios a zarpar

[...]
a este deus
que levanta a poeira dos caminhos
os levando a voar

consagro este suspiro
nele cresça até virar vendaval."

Paulo Leminski

terça-feira, 7 de outubro de 2014

Alguns hoje me falam:
Eclipse Lunar!
Telepatia!
Quinta Dimensão!
Tivesse meu terceiro olho bem aberto
veria todos
os tais eventos

Uma vela para Iansã!
Outra vela para Oxalá!
Com meus pés saúdo a terra
Com minhas mãos saúdo o ar

Na água , na erva,
e três baforadas de bom tabaco
Três toques no chão
um na testa, um na nuca, um na lateral da cabeça
e dentro dela , mais ainda:
um turbilhão de provações.


sábado, 4 de outubro de 2014

Acalanto - W. H. Auden

"Pousa, amor, a cabeça sonolenta,
Humana sobre o meu braço inconstante;
A beleza das crianças pensativas
Tempo e febres consomem lentamente
E cabe à tumba mostrar quão efêmeras
Essas mesmas crianças vêm a ser:
Mas que em meu braço , até que nasça o dia,
 Possa repousar a viva criatura,
Mortal e culpada, e , no entanto, para
Mim a coisa mais bela de se ver.

Nem a alma nem o corpo têm amarras:
Para os amantes , quando eles se deitam
No seu declive indulgente e encantado,
Tomados de languidez costumeira,
Intensa é a visão que Vênus manda
De uma simpatia sobrenatural,
De esperança e amor generalizdo;
[...]

Certeza e fidelidade se estiolam
Quando bate meia-noite o relógio
Como se fossem vibrações de um sino,
E lançam seu pedante palavratório,
Aos gritos, os delirantes em voga:
Os últimos centavos a pagar
- Assim o prevê o baralho mofino -
Serão saldados: porém, desta noite,
Que não se perca nenhum pensamento
Nenhum suspiro, nenhum beijo ou olhar.

A beleza, a meia-noite e a visão morrem:
Deixa os ventos do amanhecer, que sopram
Suaves em tua sonhadora cabeça,
Exibirem um dia de tal forma
Propício que o olho e o coração o saúdem,
Satisfeitos com o mundo mortal;
Quer a secura mediana te veja
Nutrida pela força involuntária
E permita-te ir noite adversária
Guardada pelo amor universal."

Lullaby

"Lay your sleeping head, my love,
Human on my faithless arm;
Time and fevers burn away
Individual beauty from
Thoughtful children, and the grave
Proves the child ephemeral:
But in my arms till break of day
Let the living creature lie,
Mortal, guilty, but to me
The entirely beautiful.

Soul and body have no bounds:
To lovers as they lie upon
Her tolerant enchanted slope
In their ordinary swoon,
Grave the vision Venus sends
Of supernatural sympathy,
Universal love and hope;
While an abstract insight wakes
Among the glaciers and the rocks
The hermit’s carnal ecstasy.

Certainty, fidelity
On the stroke of midnight pass
Like vibrations of a bell,
And fashionable madmen raise
Their pedantic boring cry:
Every farthing of the cost,
All the dreaded cards foretell,
Shall be paid, but from this night
Not a whisper, not a thought,
Not a kiss nor look be lost.

Beauty, midnight, vision dies:
Let the winds of dawn that blow
Softly round your dreaming head
Such a day of welcome show
Eye and knocking heart may bless,
Find the mortal world enough;
Noons of dryness find you fed
By the involuntary powers,
Nights of insult let you pass
Watched by every human love."

terça-feira, 30 de setembro de 2014

To com saudade de tu , meu desejo

"To com saudade de tu, meu desejo
To com saudade do beijo e do mel
Do teu olhar carinhoso
Do teu abraço gostoso
de passear no teu céu.

É tão dificil ficar sem você
o teu amor é gostoso demais
Teu cheiro me dá prazer
e quando estou com você
estou nos braços da paz."

Dominguinhos

quarta-feira, 24 de setembro de 2014

"nossa senhora da luz
ouro do rio belém
que seja eterno este dia
enquanto a sombra não vem."

Paulo Leminski

quinta-feira, 18 de setembro de 2014

O que o amanhã não sabe,
o ontem nunca soube.
Nada que não seja
o hoje
jamais houve.


Paulo Leminski

quinta-feira, 4 de setembro de 2014

quinta-feira, 28 de agosto de 2014

Aos poucos ia se transformando...e era ela que virava, a dona da minha cabeça...

segunda-feira, 25 de agosto de 2014

"Coração cresce de todo lado. Coração vige feito riacho colominhando por entre serras e varjas, matas e campinas. Coração mistura amores. Tudo cabe".

Guimarães Rosa
E até o verão caçou jeito e resolver aparecer, em pleno agosto!

E aos poucos seus próprios passos, em plena rua, iam se tranformando, se transfigurando, em dança.

quinta-feira, 21 de agosto de 2014

Aí vem ela chegando
 - réstia de sol em meio ao vazio da tarde-
Vem ela também:
- Vem, preta, vem!
Relato de um náufrago no meio da tarde
uma réstia de sol
arrastando cadeiras
perseguindo o sol.
Daí que eu esqueci que tinha louça pra lavar
e de passar no mercado e comprar pão
Eu esqueci que não só a tarde
mas a vida (ela também) passa
como uma tarde,
uma réstia de sol.

segunda-feira, 18 de agosto de 2014

Não basta a mente saber, o coração também intui : clareza, iluminação, limpeza e proteção.

domingo, 17 de agosto de 2014

"Sou, mas sou também o outro, o morto, ... sou um vago senhor e sou o homem que deteve as lanças do deserto." .

Jorge Luis Borges
" Não parecia que o quarto fosse sem saída, pelo menos pela porta."

Wislawa

"Lucas, sus luchas con la Hidra" - Júlio Cortázar

"Ahora que se va poniendo viejo se da cuenta que no esta facil matarla. 


Ser una hidra es fácil, pero matarla no, porque se bien hay que matar la hidra cortandole sus numerosas cabezas (de siete a nueve según los autores o bestiários  consultables) , es preciso dejarle por lo menos una,puesto que la hidra es el mismo Lucas y lo que quisiera es salir de la hidra pero quedarse en Lucas, pasar de lo poli a lo unicéfalo. Ahí te quiero ver, dice Lucas envidiándolo a Heracles que nunca tuvo tales problemas con la hidra y que despúes de entrarle a manoble limpio la dejo como una vistosa fuente de la que brotaban siete o nueve juegos de sangre. Una cosa es matar a la hidra y otra ser esssa hidra que alguna vez fue solamente Lucas y quisiera volver a serlo.[...]"

sexta-feira, 15 de agosto de 2014

"Cem catástrofes
são cem alegres piruetas
sobre cem precipícios"

Wislawa
De desandança em desandança, um dia meu pé alcança/acerta o passo, Om Shanti Shanti Shanti, que haja paz.

quinta-feira, 14 de agosto de 2014

" Ninguém poderá construir em teu lugar as pontes que precisarás passar para atravessar o rio da vida. Ninguém, exceto tu, só tu."

Nietzsche

quarta-feira, 13 de agosto de 2014

segunda-feira, 11 de agosto de 2014

Salve Jorge


"Pois com sua sabedoria e coragem
Mostrou que com uma rosa
E o cantar de um passarinho
Nunca nesse mundo se está sozinho

Salve Jorge"
 
"Sabia apenas que a paz, velha de alguns meses, se fazia agora como um tecido já gasto pelo uso."

Marguerite Yourcenar


domingo, 10 de agosto de 2014

Sambas por aí

"Vai manter a tradição
Vai meu bloco
tristeza e pé no chão"
"Sinto muito, desertos, se não lhes levo uma colher de água."

Wislawa

 Imagem: Yves Tanguy
Serenidade e até tristeza...

quinta-feira, 7 de agosto de 2014

Impregnada de silêncio, deixo ir
mais vale a serenidade,
do que esta partilha.
Prefiro o sol,
prefiro o calor do sol,
do que aquela cujo nome resplandece, luz.
Porém, dizer indetermina,
mistérios da palavra
sigo indeterminando,
esperando,
serenizando.

quarta-feira, 6 de agosto de 2014

Ponto de umbanda

Pois cada passo que dou
é uma vitória a galgar
e de joelhos em terra
sempre louvarei à meu pai Oxalá

sábado, 2 de agosto de 2014

terça-feira, 29 de julho de 2014

Vai sossegar o dia com tuas pálpebras.
Vai amainar a febre com teu riso.
Vai sossegar, acortinar o dia,
afinal, tu sabes, é só mais um dia
uma vida toda.

domingo, 27 de julho de 2014

"In my solitude
I'm praying
Dear Lord above
Send back my love"

Nina Simone
"Nas nossas duas sinas tão contrárias, um pelo outro somos ignorados:
sou filha de regiões imaginárias,
tu pisas mundos firmes já pisados"

Florbela Espanca

dúvida

"Nada está perdido ou pode ser perdido. O corpo, indolente, velho, friorento... as cinzas deixadas pelas chamas passadas... arderão novamente."

Walt Whitman

domingo, 20 de julho de 2014

"Baiano bom, baiano bom, baiano bom, sabe trabalhar." Ponto de Umbanda



A menina apareceu grávida de um gavião.
Veio falou para a mãe: O gavião me desmoçou.
A mãe disse: Você vai parir uma árvore para
a gente comer goiaba nela.
E comeram goiaba.
Naquele tempo de dantes não havia limites
para ser.
Se a gente encostava em ser ave ganhava o
poder de alçar.
Se a gente falasse a partir de um córrego
a gente pegava murmúrios.
Não havia comportamento de estar.
Urubus conversavam auroras.
Pessoas viravam árvore.
Pedras viravam rouxinóis.
Depois veio a ordem das coisas e as pedras
têm que rolar seu destino de pedra para o resto
dos tempos.
Só as palavras não foram castigadas com
a ordem natural das coisas.
As palavras continuam com seus deslimites.


Manoel de Barros

Imagem: Miró

quinta-feira, 10 de julho de 2014

Tudo corre pelo certo. Há de ter sabedoria.
"Pasmo sempre quando acabo qualquer coisa. Pasmo e desolo-me. O meu instinto de perfeição deveria inibir-me de acabar; deveria inibir-me até de dar começo. Mas distraio-me e faço. O que consigo é um produto, em mim, não de uma aplicação de vontade, mas de uma cedência dela. Começo porque não tenho força para pensar; acabo porque não tenho alma para suspender. Este livro é a minha cobardia."

Fernando Pessoa - Bernardo Soares

quarta-feira, 2 de julho de 2014

A viagem é , só e somente, para os viajantes. Para mim será, apenas, a rua de minha casa, ou a Rua dos Douradores.

O segredo

O meu maior problema é que vejo almas em todos os lugares, e absolutamente, à todo o tempo!
Nos livros leio a alma de cada palavra, de cada símbolo, ergo meu olhar e vejo a alma de todos os objetos à meu alcance, olho para meus semelhantes, são abismos de almas infindas, infinitas, que nunca se ajeitam em uma coisa só, ou em seu próprio corpo. E por último, olho para mim mesma no espelho, e me pego em imensa vertigem - evito o olhar que possa ser talvez, minha última perdição: de saber-se ser e estar em todas as coisas ao mesmo tempo, por todas as eras, em todos os lugares. 

  

terça-feira, 1 de julho de 2014

Demorou para compreender que mesmo o desejo mais sublime da alma ainda é um desejo...e lembrou do que os santos discutiam: que o caminho espiritual não é, e nem deveria ser, um vale de júbilo.

sexta-feira, 27 de junho de 2014

"Pois agora ele estava desperto e bem sabia
Que ninguém é poupado nunca, exceto em sonhos.
Mas havia algo mais que o pesadelo distorcera -
Mesmo o castigo era humano e uma forma de amor."

W.H. Auden

E cada qual, no cárcere de si mesmo, está quase convencido de ser livre.

W.H. Auden

Ontem o cálculo da sombra em regiões solares. Hoje porém a luta.

W. H. Auden
Era tarde quando chegara à casa, mas ainda se encontrava aberta.
-Trouxeste a chave? perguntou-me.
-Eu imaginava lhe pedir o mesmo, eu respondi.
Me olhando ainda de cima a baixo ele me disse:
- Se tu não trouxeste a tua chave, como pretende encontrar o segredo?

domingo, 22 de junho de 2014

"Assovia o vento dentro de mim.
Estou despido. Dono de nada, dono de ninguém, nem mesmo dono de minhas certezas, sou minha cara contra o vento, a contravento, e sou o vento que bate em minha cara."

Eduardo Galeano
as marcas que eu não fiz em mim, são as marcas que eu mais carrego comigo. Elas são o que eu sou.


quarta-feira, 11 de junho de 2014

"Desafiado o destino, tudo será destino"

Já dizia Sófocles.

terça-feira, 10 de junho de 2014

Quando na fogueira, eu me transformo:
eu sou o próprio fogo.

domingo, 8 de junho de 2014


Canto à imagem que se vai da areia, dos índios do novo México

"Para que eu me cure,
o feiticeiro pintou,
no deserto, tua imagem:
teus olhos são de areia dourada,
de areia vermelha é agora tua boca,
de areia azul são teus cabelos
e minhas lágrimas são de areia branca.
Todo o dia pintou.
Crescias como uma deusa
sobre a imensidão da tela amarela.
O vento da noite dispersará a tua sombra
e as cores da tua sombra.
Segundo a lei antiga, nada me restará.
Nada, a não ser o resto de minhas lágrimas,
areias de prata."

















 Eduardo Galeano - Memória do fogo

quinta-feira, 5 de junho de 2014

Quando chega aos lábios: morte certa,
nunca o gesto alcança a minha mão.

Senhor Cidadão - Tom zé

"Senhor cidadão
senhor cidadão
Me diga, por quê
me diga por quê
você anda tão triste?
tão triste
Não pode ter nenhum amigo
senhor cidadão
na briga eterna do teu mundo
senhor cidadão
tem que ferir ou ser ferido
senhor cidadão
O cidadão, que vida amarga
que vida amarga.

Oh senhor cidadão,
eu quero saber, eu quero saber
com quantos quilos de medo,
com quantos quilos de medo
se faz uma tradição?

Oh senhor cidadão,
eu quero saber, eu quero saber
com quantas mortes no peito,
com quantas mortes no peito
se faz a seriedade?

Senhor cidadão
senhor cidadão
eu e você
eu e você
temos coisas até parecidas
parecidas:
por exemplo, nossos dentes
senhor cidadão
da mesma cor, do mesmo barro
senhor cidadão
enquanto os meus guardam sorrisos
senhor cidadão
os teus não sabem senão morder
que vida amarga

Oh senhor cidadão,
eu quero saber, eu quero saber
com quantos quilos de medo,
com quantos quilos de medo
se faz uma tradição?

Oh senhor cidadão,
eu quero saber, eu quero saber
se a tesoura do cabelo
se a tesoura do cabelo
também corta a crueldade

Senhor cidadão
senhor cidadão
Me diga por que
me diga por que
Me diga por que
me diga porque"

quarta-feira, 28 de maio de 2014

Mês à mês, temos sangrado
Nós, as fêmeas
por séculos
A matéria nossa
que circula
esparramada
mês à mês
Portanto pode-se dizer
que o que de nós escorre
é bem mais vital
que o sal
que a dor que emana
dos olhos
mais visceral
que o sal
que a água.

"Não tem sol o céu, imenso teto de estanho, nem tem a terra fogueiras que a aqueçam. Jamais esteve esta estepe tão gelada e solitária." E. galeano

Canção de Guerra dos Incas

"Beberemos no crânio do traidor
e com seus dentes faremos um colar.
De seus passos faremos flautas,
de sua pele faremos um tambor.
Então dançaremos."

Memória do Fogo - E. Galeano

"E não será por feitiço, e sim por ânimo do coração e valentia dos braços" E. Galeano

domingo, 25 de maio de 2014

A magia

        "Uma velha muito velha, da aldeia dos tukuna, castigou as moças que lhe haviam negado comida. Durante a noite, arrebatou-lhes  os ossos das pernas e devorou-lhes a medula. Nunca mais as moças puderam caminhar.
        Lá na infância, pouco depois de nascer, a velha tinha recebido de uma rã os poderes do alívio e da vergonha. A rã tinha ensinado a velha muito velha a curar e a matar, a escutar as vozes que não se ouvem, e a ver as cores que não se veem. Aprendeu a defender-se antes de aprender a falar. Ainda não andava, e já sabia estar onde não estava, porque os raios do amor e do ódio atravessaram de um salto as mais espessas selvas e os rios mais fundos.
        Quando os tukuna cortaram sua cabeça, a velha recolheu em suas mãos o próprio sangue e soprou-o para o sol.
- A alma também entra em tí! - gritou.
        Desde então, o que mata recebe no corpo, embora não queira nem saiba, a alma de sua vítima."

Memória do Fogo - Eduardo Galeano

Imagem : Diário de Frida Kahlo


A Pachamama

No planalto andino, mama é a Virgem e mama é a terra e o tempo.
Fica zangada a terra, a mãe terra, a Pachamama, se alguém bebe sem lhe oferecer. Quando ela sente muita sede, quebra a botija e derrama o que está lá dentro.
A ela se oferece a placenta do recém-nascido, enterrando-a entre as flores, para que a criança viva; e para que o amor viva, os amantes enterram cachos de cabelos.
A deusa terra recolhe nos braços os cansados e os maltrapilhos que dela brotaram, e se abre para lhes dar refúgio no fim da viagem. Lá embaixo da terra, os mortos florescem.

Do livro "Memória do Fogo -As Caras E As Máscaras " de Eduardo Galeano

Imagem: Frida Kahlo -The Love Embrace of the Universe, the Earth (Mexico), Me, and Senor Xolotl


quinta-feira, 22 de maio de 2014

O nascimento do poema - Adélia Prado

O que existe são coisas,
não palavras. Por isso
te ouvirei
sem cansaço recitar em búlgaro
como olharei montanhas durante horas,
ou nuvens.
Sinais valem palavras,
palavras valem coisas,
coisas não valem nada.

Entender é um rapto,
é o mesmo que desentender.
Minha mãe morrendo,
não faltou a meu choro este arco-íris:
o luto irá bem com meus cabelos claros.

Granito, lápide, crepe,
são belas coisas ou palavras belas?
Mármore, sol, lixívia.
Entender me sequestra de palavras e de coisa,
arremessa-me ao coração da poesia.

Por isso escrevo os poemas
pra velar o que ameaça minha fraqueza mortal.

(...)
"Há uma fome em tí portentosa demais para o teu nome, e não é que cabe no teu desprezível buraco todas as tuas fomes?"

Hilda Hilst

quarta-feira, 21 de maio de 2014

A prova do que é real ou não, é o que eu sinto, não é?
Não importa se há verdade
A realidade não implica em verdade.
Não se sabe nem se a morte nos faz algum favor
se o eterno retorno, retornará mais uma vez
neste mesmo quarto, nesta mesma sala de estar
o mesmo sonho confuso, o mesmo pesadelo
o mesmo reflexo
no mesmo espelho.

domingo, 18 de maio de 2014

Sou discípula de Mersault, de Pessoa e do rei de Carmona
Carrego metralhadoras por trás dos meus olhos e dos meus dentes
Desacredito dos crentes mais do que das crenças
Tenho texturas de pedra dentro do peito
e um sono denso,
sem sonho que me console
nem realidade que me apeteça.

Bucowski

então queres ser um escritor?

se não sai de ti a explodir
apesar de tudo,
não o faças.
a menos que saia sem perguntar do teu
coração, da tua cabeça, da tua boca
das tuas entranhas,
não o faças.
se tens que estar horas sentado
a olhar para um ecrã de computador
ou curvado sobre a tua
máquina de escrever
procurando as palavras,
não o faças.
se o fazes por dinheiro ou
fama,
não o faças.
se o fazes para teres
mulheres na tua cama,
não o faças.
se tens que te sentar e
reescrever uma e outra vez,
não o faças.
se dá trabalho só pensar em fazê-lo,
não o faças.
se tentas escrever como outros escreveram,
não o faças.
se tens que esperar para que saia de ti
a gritar,
então espera pacientemente.
se nunca sair de ti a gritar,
faz outra coisa.
se tens que o ler primeiro à tua mulher
ou namorada ou namorado
ou pais ou a quem quer que seja,
não estás preparado.
não sejas como muitos escritores,
não sejas como milhares de
pessoas que se consideram escritores,
não sejas chato nem aborrecido e
pedante, não te consumas com auto-
— devoção.
as bibliotecas de todo o mundo têm
bocejado até
adormecer
com os da tua espécie.
não sejas mais um.
não o faças.
a menos que saia da
tua alma como um míssil,
a menos que o estar parado
te leve à loucura ou
ao suicídio ou homicídio,
não o faças.
a menos que o sol dentro de ti
te queime as tripas,
não o faças.
quando chegar mesmo a altura,
e se foste escolhido,
vai acontecer
por si só e continuará a acontecer
até que tu morras ou morra em ti.
não há outra alternativa.
e nunca houve.
Nada comunica nada. Nada soluciona, nada instiga. É uma grande falácia dizer, tanto quanto é falácia escutar. Obscurecer e duplificar. A desconstrução já não é mais subversiva, nem atrativa, nem inteligente.