quinta-feira, 16 de janeiro de 2014

Soneto da doce queixa

"O que temo é perder o encanto exposto
em teus olhos de estátua, e assim o acento
que de noite me imprime em plena face
de teu alento a
rosa solitária 
 
Tenho pena de ser nesta ribeira
tronco sem ramos; e o que mais eu sinto
é não ter a flor, polpa, ou argila  à gosto
para o íntimo verme do meu sofrimento. 


Se em mim és o tesouro se ocultando,
se és minha cruz e meu pesar molhado,
se sou o cão o teu solar guardando,


não tires o que é meu e me foi dado
e põe sobre teu rio, decorando-o,
folhas do meu outono alucinado."

Frederico García Lorca

Estátua,verme que sou que de nada se alimenta
sem feições de maravilha, nem em carne,
o tempo em todos se dilata, à mercê das lembranças que mais gastam
em tardes e tardes de conversas na varanda.

Estátua-escória impressa na tua memória que é água
universos, cosmos, feitos de água
que é etérea, e vasta
como é este momento, como sou, e o ser.

Contorno-adorno que não clareia, e emudece o quadro
já mudo, que é circunstância da beleza
das coisas não ditas, da palavra impronunciável
em qualquer idioma, em qualquer paladar

Qual chama acende a chama que não pode se apagar?
 as formas que nem minha mente consegue manter
da distancia entre meus pensamentos, meus dedos e o papel
de qualquer distância essencial
do que se quer e se pode ver.