quinta-feira, 3 de dezembro de 2015

Maio

"Maio já está no final
O que somos nós, afinal
Se já não nos vemos mais
Estamos longe demais
Longe demais

Maio já está no final
É hora de se mover
Pra viver mil vezes mais
Esqueça os meses
Esqueça os seus finais
Esqueça os finais"

sexta-feira, 23 de outubro de 2015

Tira-Teima , Bernardo Vilhena (Poesia Marginal ou Geração Mimeógrafo)

Tire a faca do peito
e o medo dos olhos
Ponha uns óculos escuros
e saia por aí. Dando bandeira
Tire o nó da garganta
que a palavra corre fácil
sem desculpas nem contornos
Direta: do diafragma ao céu da boca
Tire o trinco da porta
liberte a corrente de ar
Deixe os bons ventos levantarem a poeira
levando o cisco ao olho grande
Tire a sorte na esquina
na primeira cigana ou no velho realejo
Leia o horóscopo e olhe o céu
lembre-se das estrelas e da estrada
Tire o corpo da reta
e o cu da seringa
que malandro é você, rapaz
o lado bom da faca é o cabo
Tire a mulher mais bonita
pra dançar e dance
Dance olhando dentro dos olhos
até que ela morra de vergonha
Tire o revólver e atire
a primeira pedra
a última palavra
a praga e a sorte
a peste, ou o vírus?

Uma Noite - Afonso Henrique Neto (Poesia marginal ou Geração Mimeógrafo)

o tio cuspia pardais de cinco em cinco minutos.
esta grama de lágrimas forrando a alma inteira
(conforme se diz da jaula de nervos)
recebe os macios passos de toda a família
na casa evaporada
mais os vazios passos
de ela própria menina.
a avó puxava linhas de cor de dentro dos olhos.
uma gritaria de primos e bruxas escalava o vento
escalpelava a tempestade
pedaços de romã podre
no bolor e charco do tanque.
o pai conduzia a festa
como um barqueiro
puxando peixes mortos
nós
os irmãos
jogávamos no fogo
dentaduras pétalas tranças
fotografias cuspes aniversários
e sempre
uma canção
só cal e ossos
a mãe de nuvem parindo orquídeas no cimento.

Espaço e Ordem. Um universo todinho meu.


sexta-feira, 16 de outubro de 2015

Três relatos



01 de setembro de 2015 
Escrever. Como um tolo exercício á mão tola.
Estacionando meu ego para a tarefa imperfeita(deveria escrever com meu útero).
Agora os acordes me lembram da  última vez, quando as paredes daquela casa pareciam desproporcionais, as luzes , as conversas..não importa. Nada dói.  Nada fere. Estou seca da única verdade absoluta. 

03 de setembro de 2015
(ecoute a nouvelle vague)
De noite uma agulha perfurou meu cérebro. Fiquei surda por um tempo. Ainda confundo a realidade com o sonho e vice versa. Não gosto mais de canções a não ser as tristes. Isso aqui não é nenhum mistério. Chega de diversão para vocês.

05 de setembro de 2015 
Epifanicamente dizendo, estou rasa de significados. Mas meu gato me preenche por dentro. (Não sei porque , mas parece que os pensamentos não estão mais aqui, estão á uma certa distancia da minha cabeça, por isso me custa um tempo até encontra-los na minha boca.)

terça-feira, 29 de setembro de 2015


Em seu pesadelo colorido ele pintou a fúria do monstro, perturbado por aquilo que não consegue desprender de sí, e que talvez faça parte dele mesmo.A verdade é que a besta não sabe o que é.

segunda-feira, 28 de setembro de 2015



Tudo está repleto mas não sinto.
 Minha mente quieta desconhece textos, diplomas e todos os fenômenos estéticos.
Creio na mística mas ela não me crê.
E está um pouco só aqui deste lado do mundo.

domingo, 20 de setembro de 2015

sábado, 12 de setembro de 2015

terça-feira, 8 de setembro de 2015

Mulheres que correm com os lobos - A garota dos palitos de fósforo

Qualquer um que não apoie sua arte, sua vida, não é digno do seu tempo.


Afugentando a fantasia criativa
Essa criança está num ambiente em que as pessoas não se importam com ela. Se você está num ambiente desses, saia daí. Essa criança está num meio no qual o que ela tem, foguinhos em palitos — o início de toda possibilidade criativa — não é valorizado. Se você estiver numa aflição semelhante, vire as costas e vá embora. Essa criança está numa situação psíquica na qual há poucas opções. Ela se resignou ao seu "lugar" na vida. Se isso aconteceu com você, pare de se resignar e saia.

sábado, 5 de setembro de 2015

Minha intuição vai á frente dos acontecimentos.
Minha alma caminha por trás do meu corpo.
Eu sou a boneca de sal que não tem pressa de ir ao mar.

sexta-feira, 28 de agosto de 2015

Sou uma brisa e já não sei dizer
o que é, e o que não é sonho.

terça-feira, 25 de agosto de 2015

Com esta espada eu corto
a última parte enferma de nós.

domingo, 23 de agosto de 2015

rosas de um fim



Fiquei com pena das flores, que culpa elas tem? Mas hesitei, entre meu quarto e a rua muitas vezes. Mas o moço tinha me concedido as rosas com tanto cuidado, e me chamou de pura. É uma pena que elas tenham vindo parar no meu quarto. Pelo menos aqui terão o meu cuidado.

quarta-feira, 12 de agosto de 2015

sem profecia



Já fui jaspe, turquesa e ágata fogo, hoje sou água marinha.
Meu temperamento não beira as circunstâncias, mas é melhor assim.
 Cartas, mostrem-me o futuro, o que virá
se mais transmutação que esta paz,
ou se mais lunar.

segunda-feira, 20 de julho de 2015

"Poeta que é poeta não perde a parada
O que vem é festa pro meu coração"

sexta-feira, 17 de julho de 2015

Fibrilações - Adélia Prado

Tanto faz
funeral ou festim
tudo é desejo
que percute em mim.
Ó coração incansável a ressonância das coisas,
amo, te amo, te amo,
assim triste, ó mundo,
ó homem tão belo que me paralisa.
Te amo, te amo.
E uma língua só,
um só ouvido, não absoluto.
Te amo.
Certa erva do campo tem as folhas ásperas
recobertas de pelos,
te amo, digo desesperada
de que outra palavra venha em meu socorro.
A relva estremece, o amor para ela é aragem.

domingo, 12 de julho de 2015

Natal - Fernando Pessoa


"Nasce um Deus. Outros morrem. A verdade
Nem veio nem se foi: o Erro mudou.
Temos agora uma outra Eternidade,
E era sempre melhor o que passou.

Cega, a Ciência a inútil gleba lavra.
Louca, a Fé vive o sonho do seu culto.
Um novo Deus é só uma palavra.
Não procures nem creias: tudo é oculto."

Fernando Pessoa

"Já repeti o antigo encantamento,
E a grande Deusa aos olhos se negou.
Já repeti, nas pausas do amplo vento,
As orações cuja alma é um ser fecundo.
Nada me o abismo deu ou o céu mostrou.
Só o vento volta onde estou toda e só,
E tudo dorme no confuso mundo.[...]"

Fernando Pessoa

"NESTA vida, em que sou meu sono,
Não sou meu dono, 
Quem sou é quem me ignoro e vive
Através desta névoa que sou eu
Todas as vidas que eu outrora tive,
Numa só vida.
Mar sou; baixo marulho ao alto rujo,
Mas minha cor vem do meu alto céu,
E só me  encontro quando de mim fujo.[...]"

sábado, 23 de maio de 2015

A paz do fim

Me desespera
Não se vá assim
Quem te desespera sou eu
Que eu só quero te livrar de mim
Então você desiste e me diz adeus
E nem percebe que eu
Já não estou aqui
Vá com cuidado, fique com Deus
Sabe, eu desejo que você encontre
Logo, logo, logo, logo
A paz do fim
A paz do fim
A paz do fim
A paz do fim

Ana Larousse

sexta-feira, 22 de maio de 2015

Faz


Traz o teu amor
Me encanta o teu amor
Ameno
Nisso eu acredito mais que tudo
Traz o teu amor
Me empresta o teu amor
Queremos
Todo mundo gosta mais que tudo
Vivo o teu amor
Só quero o teu amor
Sem falta o teu amor
E além do teu amor
Você ao infinito pra mim
Ao infinito
Ao infinito pra mim
Ao infinito
Ao infinito pra mim
Leva o meu amor
Tempera o meu amor
Veneno
Bate e vê se deixa mais enxuto
Leva o meu amor
Estraga o meu amor
Veremos
Quebra e vê se deixa mais enxuto
Deixa o meu amor
Não quero o meu amor
Vai, mate o meu amor
E além do meu amor
A mim
Que eu me demito por fim
Que eu me demito
Que eu me demito por fim
Que eu me demito
Que eu me demito por fim


Phil Veras e Ana Larousse

quarta-feira, 20 de maio de 2015

conversa com a pedra

Por Wisława Szymborska
Bato à porta da pedra.
– Sou eu, deixa-me entrar.
Quero penetrar no teu interior,
olhar ao redor,
prender-te como a respiração.
– Sai – diz a pedra.
Sou hermeticamente fechada.
Mesmo quebradas em pedaços
vamos ficar hermeticamente fechadas.
Mesmo trituradas em grãos
não vamos deixar ninguém entrar.
Bato à porta da pedra.
– Sou eu, deixa-me entrar.
Venho por curiosidade pura.
A vida é a única ocasião para ela.
Pretendo passear pelo teu palácio,
e depois visitar a folha e a gota dӇgua.
Não tenho muito tempo para tanto.
Minha mortalidade deveria te comover.
– Sou de pedra – diz a pedra –
e sou obrigada a manter a seriedade.
Sai daqui.
Não tenho os músculos do riso.
Bato à porta da pedra.
– Sou eu, deixa-me entrar.
Ouvi dizer que em ti há grandes salas vazias,
nunca vistas, inutilmente lindas,
surdas, sem eco de passos de quem quer que seja.
Reconhece, tu mesma não sabes muito sobre isto.
– Salas grandes e vazias – diz a pedra –
mas nelas lugar não há.
Lindas, talvez, mas além do gosto
de teus pobres sentidos.
Podes me conhecer, mas me provar nunca.
Com toda a minha superfície me volto para ti,
mas com todo o meu interior te dou as costas.
Bato à porta da pedra.
– Sou eu, deixa-me entrar.
Não busco em ti um refúgio para a eternidade.
Não sou infeliz.
Não estou desabrigada.
Meu mundo é digno de retorno.
Vou entrar e sair com as mãos vazias.
E como prova de que realmente estive pre sente,
não vou mostrar nada além de palavras
às quais ninguém dará fé.
– Não vais entrar – diz a pedra –
Falta a ti o sentido da participação.
Nenhum sentido substitui o sentido da participação.
Mesmo a visão elevada até à clarividência
não serve para nada sem o sentido da participação.
Não vais entrar, tens apenas uma noção deste sentido,
apenas o seu germe, sua imagem.
Bato à porta da pedra.
– Sou eu, deixa-me entrar.
Não posso esperar dois mil séculos
para entrar debaixo do teu teto.
Se não crês em mim – diz a pedra –
Dirige-te à folha, ela te dirá o mesmo que eu,
e à gota d”água, que te dirá o mesmo que a folha.
Por fim pergunta aos fios de teu próprio cabelo.
Um riso se alarga em mim, um riso, um riso enorme,
que eu não sei rir.
Bato à porta da pedra.
– Sou eu, deixa-me entrar.
– Não tenho porta – diz a pedra.

"Ninguém pode curar aquele que Deus desviou"

terça-feira, 19 de maio de 2015

"Disseste que se tua voz tivesse força igual

À imensa dor que sentes

Teu grito acordaria

Não só a tua casa

Mas a vizinhança inteira


E há tempos nem os santos têm ao certo

A medida da maldade

Há tempos são os jovens que adoecem"

quinta-feira, 14 de maio de 2015

Um lance de dados - Mallarmé

JAMAIS


MESMO ATIRADO EM CIRCUNSTÂNCIAS ETERNAS


DO FUNDO DUM NAUFRÁGIO

PORQUE
            o Abismo

Branco
            se expõe
                        furioso

                                   sob uma inclinação
                                               desesperadamente  plana
                                                                                  d’ asa
                                                                                 
                                                                                              a sua

recaída prévia dum mal de se erguer no voo
                                    cobrindo os impulsos
                                               cortando rente os ímpetos

            no âmago se resume

a sombra que se afunda nas profundas nessa alternativa vela

                        para adaptar
                                   a tal envergadura
           
                as suas horríveis profundas como o arcaboiço

                        duma construção
                 que balança dum lado
                                               para o outro



            O MESTRE

emerge
            inferindo

                                                                                              dessa conflagração

                                                                                                                      que se

                                                                                 
como uma ameaça

o único Número que não pode


hesita
cadáver descartado
em lugar
            de jogar
                        como um velho maníaco
                                               a partida
                                   em nome das marés

um


naufrágio assim
livre dos antigos cálculos
       esquecido o manobrar com a idade

           
                        outrora ele empunhava o leme

a seus pés
            num horizonte unânime
prepara
            se agita e se envolve
                        no punho que o ligará
ao destino dos ventos

            ser um outro

                        Espírito
                                   para o Lançar
                                                           na tempestade
                                               e redobrar a divisão e passar altivo

pelo braço do segredo que encerra





invadiu o comandante
correndo pela barba submersa

vindo do homem

            sem nau
                        insignificante
                                               onde será vão

ancestralmente abrir ou não a mão
                                               crispada
                                   além duma cabeça inútil

            legada em desaparição
           
                                               a alguém ambíguo

                                           imemorial ulterior demónio

nos seus lugares do nada

                                   induz
o ancião a essa conjunção suprema com a probabilidade

                                    o tal
                                          da sombra pueril
acariciada e polida aparada e lavada
                                   amaciada pela onda e afastada
                                     dos ossos duros perdidos em bocejos

                                               nascido
                                                           dum descuido
jogando o mar por antepassado ou o antepassado contra
                                    o mar
                        numa sorte ociosa

São núpcias

da qual a ilusão é uma vela solta obcecada
com o fantasma dum gesto

            que oscila até cair
           
                                               na loucura









NÃO ABOLIRÁ




TAL COMO
Uma insinuação

ao silêncio




em algo próximo

esvoaça

simples

envolta em ironia
                        ou
                                   precipitado
                                                           uivado
                                                                       mistério

dum turbilhão hilariante e horrível

em redor do abismo
                                   sem nele se fixar
                                                           nem fugir
                                  
a embalar todo o indício virgem
                      
                                                                      TAL COMO





perdida solitária pena






                                                                                  Salvo
quando o encontro ou o aflorar do toque
da meia-noite a deixa
                        imóvel
                        no veludo amarrotado por um riso sombrio

                       
essa brancura rígida

irrisória
                                   que se opõe ao céu
            demasiado
                                   para que não deixe marcas
                                                                       exíguas
                                                                                  em qualquer
                                   amargo príncipe de escolhos

                                   e que disso se enfeita como de irresistível
                                                           heroísmo que sabe contido
                                               pela sua curta e viril razão
                                                                                              em cólera



inquieto
            expiatório e púbere
                                                           calado





            A lúcida e senhorial crista
na fonte invisível
                                                                                              cintila
e depois sombreia
uma estatura gentil e tenebrosa
na sua torção de sereia

através de impacientes escamas





                                   Riso
                                               que
                                              
                                                           Se


de vertigem


de pé
           
            o tempo
                        de esbofetear
bifurcadas

                        numa rocha

            falsa mansão

                                   evaporada na bruma

                        que impôs
                                   fronteiras ao infinito



ERA
de origem estelar


Ou SERIA
            pior
                        nem mais
                                   nem menos     
                                               indiferentemente
                                                                       mas tanto

           
                                              

                                                                                  O NÚMERO

                                                           SE EXISTISSE
diverso da alucinação esparsa da agonia

                                    COMECASSE OU FINDASSE
ensucedor e não negado e preso quando aparecesse
                                   enfim
                        através duma profusão ampliada e rara
                                                                       SE CONTASSE

Como evidência da soma pouca uma
                                                                       SE ILUMINASSE

                       
                                    O ACASO

Cai
        a pena
            rítmica suspensa do sinistro
                                                          para se afundar
                                   na espuma original
            recente onde explode o delírio até ao cimo
                                               desvanecido
                                   pela neutralidade idêntica do abismo




NADA


                           da memorável crise
 em que teve lugar
o acontecimento
havido em vista de qualquer
resultado nulo
                        humano

                                               TERÁ TIDO LUGAR
                        uma simples ascensão na direcção
                        da ausência

SENÃO O LUGAR   
inferior marulhar como
para dispersar um acto vazio
            abruptamente
            e
          através da mentira
                         decidir
               a sua perdição

nestas paragens
                        do vago

                                               em que toda a realidade se dissolve

EXCEPTO
                        a altitude
                                               TALVEZ
                                                                       tão longe como
                                                                                              o lugar

que com o além se funde
                                   longe do interesse
                                   que em geral se lhe assinala
segundo esta obliquidade ou aquela
delectividade
                        de fogos

            para esse lugar que deve ser
                        o Setentrião também chamado Norte

                                               UMA CONSTELAÇÃO

                        arrefece no olvido e no desuso
                                                           mesmo que ela enumere
                                   em qualquer vaga e superior superfície
                                                           o choque sideral e sucessivo
                                   do cálculo total em formação

velando
            duvidando
                                   brilhando e meditando

                                                           antes de se deter
                                   em qualquer ponto derradeiro que o sagra

                                   Todo o Pensamento produz um Lance de Dados